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sábado, 24 de agosto de 2013

O bando dos quatro - Parte 1/?



Ele olhou para o desenho e teve vontade de chorar. Era pavorosa a composição de cores berrantes que mal preenchia aquela folha de linhas com uma dobra à direita, que o separava a punitiva prisão que se chamava primária da primavera libertadora que adivinhava no ciclo preparatório.
Mas uma lágrima fortuita foi o suficiente para dar vida àquele borrão de cor a que o solene e assustador júri chamava de prova de desenho. E logo a folha de papel ganhou relevo e, entre montes, arvores e aquela casinha tão primitiva quanto tortuosa (até a chaminé fumegava direita ao Sol) a poça transformou-se em lago e emergiu a cova dos sapos, tão reais eram os sons dos sapos aos saltos que ele se assustou, naquela carteira de sala de aula, uma combinação de cadeira e mesa castanhas, de inclinação vertiginosa para as inseguranças dele e para os lápis que não cabiam na ranhura a eles dedicada
E um sapo saltou da poça, da folha de papel, do desenho inacabado e infeliz, salpicando as lunetas arquejantes e bem construídas do menino Einstein.
Saltou da poça, a única superfície molhada da cova dos sapos, um acidente físico de origem desconhecida, repleto de dunas arenosas e um patético charco, que evoluía entre uma sombra de lodo e uma piscina infantil, natural é certa, mas suficiente para manter ativos os seis sapos que, por ali, tinham decidido permanecer, bem para além dos Invernos rigorosos de outrora
Mas havia lei e ordem no charco: havia um rei, o rei sapo, e a miudagem que preparava romarias ao longo da poeirenta estrada real, logo o tinham identificado no alto do seu grande papo, papo de sapo bem entendido, papo de rei repetiam os putos, habituais salteadores destas remotas paragens.
Bem, remotas para quem tem nove anos e umas bicicletas tão remendadas quanto os seus joelhos, que os calções não escondem e os travões não travam!
Do cimo dos montes Golan – um dos putos tinha vocação geopolítica, e esta linguagem militar pretendia identificar, sem equívocos, o ponto mais alto do mundo dos sapos - avistava-se, se bem que remotamente, os últimos prédios da vila, o parque municipal…
…E o Tribunal – sentenciava o outro puto, o juiz imperfeito
Esta comunidade de anfíbios vivia a sua perene vida entre os montes e seus arredores e durante o dia evitava afastar-se do charco – ou lago conforme a chuva e a altura do ano – porque aqueles putos não eram de confiança.
Com o rei sapo viviam os seus súbditos: A princesa batráquia, o sapo gramofone, o anfíbio maratona,

E neste dia tão decisivo para o jovem Einstein, foi o sapo gramofone que decidiu dar vida à prova de desenho do pretendente a cientista sem vocação para a arte de desenho e invadiu a sala de aula aos saltos, de secretária em secretária, júris incrédulos e outros assistentes eufóricos por esta demonstração de natureza viva no salão de mestres de escola, velhos descendentes dos dinossauros…

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