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terça-feira, 27 de setembro de 2016

One thousand villages

Columbia Flower Market

O desafio de Domingo era outro.
Descobrir se existia uma Londres suburbana, quase rural, uma terra de quase agricultores, de seres que cultivam os parques infantis e as quintas ecológicas, de ruas que se espraiam em mercados de flores e a fúria dos prédios de vidro que se encolhem diante da persistência dos mercados de rua, coisas sérias a partir de cinco libras, outras menos sérias a partir de três libras e bugigangas a uma libra
Mal se atravessa a linha que separa as duas polícias, na igual medida em que nos afastamos do glorioso West End da família real e de Charles Dickens, os números contam, as famílias expandem-se entre roupas amontoadas e a fumegante comida de rua, e a diversidade cultural e étnica constrói-se de rituais e rotinas pagãs.
“Ladies, please come, it’s time to spend your Money with me”

Peticoat Lane

Peticoat Lane

Subindo a Bethnal Green em direção ao enclave espanhol, cruzam-se ruas sem trânsito de esquinas arredondadas por casas térreas que vivem de portas abertas e observam os transeuntes que transportam bouquets de flores rua abaixo, embrulhados em papel pardo, sinal de uma vizinhança que habita os Domingos no mercado das flores
“Estas flores não precisam de água e duram mais do que eu e tu, juntos”

Bethnal Green

Columbia Flower Market

Columbia Flower Market - Backstreet Boys

Bethnal Green

Às quatro e meia, o mercado rende-se a um leilão de substâncias perecíveis e toda a gente parece adivinhar que esta é a hora de encher as janelas de flores tardias, de preço descontado e de alma cheia.
Os triciclos competem com as trotinetes por um lugar no meio da rua e ninguém se preocupa com o trânsito inexistente
E crianças, muitas crianças que, aos berros, te dizem que a leste de Bethnal Green já não mora a sofisticada Linda
Apenas o agridoce “melhor café do mundo” que é servido em cima do Regent’s Canal, a caminho do mercado de Broadway, rodeado de cebolas e batata-doce, alho francês e especiarias diversas.
A leste de um Domingo cinzento vive outro mundo, os boat people que não precisam de lutar pela vida para aqui se instalar, nas margens do canal que, em Setembro, cobre-se de verde e prolonga o parque Vitoria para além da margem sul.
Mas a malta não se parece importar porque são estruturalmente desleixados, vivem no seu quintal de copo de vinho tinto na mão e cabelos sebosos, intrincados e compridos, convivem numa inércia calculada com os corredores de fim de semana, vestidos com óculos de uma existência marginal,
Um Buda na proa,
Um triciclo no telhado,
Tralha espalhada pela popa,
Uma vida desarrumada que se espreita para dentro do fogão vintém,
A lenha que espera, empilhada, um espaço que se abra nos apertados espaços do inverno,
“Ice Cream, Cake Cream, everybody scream”
É apenas mais uma charada de duas miúdas de fatos de treino laranja que deixam o eco para trás, enquanto o último dos eremitas medita, de pernas cruzadas, em equilíbrio com a popa verde do batelão esquecido.
Afinal de contas Londres não tem de ser apenas centralidade, sofisticação, independência, maioridade e vanguarda.
Um local tão internacional tão multicultural que dispensa raízes
Existe em diversos algures, por esta longa e dispersa cidade, lugares onde se sente uma abraço chamado família, onde não existe qualquer pressão para as pessoas serem independentes.
É este o outro lado equilibrador da natureza humana.

Certo?
Regent's Canal



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