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quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Horrendous Jack



Mórbido
Sórdido
Detalhado, explícito e muito visual
O especialista de Jack, um barbudo historiador que aceita gorjetas, sem escrúpulos ou arrependimento, adapta-se ao numeroso público de entusiastas de Jack, para ondular o seu discurso e a sua pose num mar revolto de detalhes científicos e exacerbadas especulações teatrais.
O historiador é provavelmente um ator e esta é, a sua declamação preferida.
Não é uma tarefa fácil para este jovem Jack, porque não é nada visual para estes amadores de Jack The Ripper, a Londres Oriental do século dezanove, longe do fulgor da cidade vitoriana, o bairro das docas, pejado de homens duros e violentos que invadiam as ruas e os bares da noite, sobrelotado de párias de sem abrigo e de gente desamparada, e o último refúgio de mulheres desesperadas, que apenas sobreviviam se vagueassem nas noites perigosas e se sujeitassem aos desejos dos homens duros, violentos e sem escrúpulos.
Mesmo quando ele agita os braços, abre muito os olhos e se desfaz em sórdidas descrições dos assassinatos do Jack.



É que Whitechapel, Brick Lane e Shoreditch são, hoje, os locais da nova revolução urbanística de Londres, e não há esquina em que, acreditando que vamos encontrar Jack, não tropecemos em beautiful people ou hordas de turistas à procura de Jack.
E grandes prédios de vidro luminoso.
E restaurantes indianos.
E uma onda de cidade nova que se apropria dos poucos espaços intactos, desde o famigerado século dezanove.
Até parece bizarro que os ingleses, que tão ferozmente preservaram a Vitoriana West End, se mostrem tão ferozes a destruir as reminiscências da história destes bairros.
Ou não. Culpa de Jack porventura, aparentemente nenhum urbanista da cidade parece suportar o passado lúgubre da East London.



Mas ele esforça-se por asseverar que Jack será sempre um mito.
É que, quando todos os vestígios do tempo desaparecerem deste bairro, é a sombra, a fama e a façanha de Jack que, provavelmente, lhe garantirá o emprego.
Ou não.
Jack é um mito, porque nunca foi apanhado, porque desafiou os desencontros das duas polícias de Londres no espaço que era a zona de fronteira, a zona de ninguém e a linha que ninguém ultrapassava.
E sobretudo porque J. não poderia, segundo os especialistas, um homem (seria um homem?) com origem neste local doentio, lúgubre e miserável.
Pelo estilo
Pelo à vontade.
Pelos conhecimentos de anatomia humana
Pela forma furtiva como se movia.
Cento e dezoito anos depois, Jack parece ser o único sobrevivente deste imaginário impiedoso, não fosse impossível, ele não ter morrido.
E os entusiastas continuam a especular.





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