O termómetro batia 35º nas
encostas do vale interior. Branco e azul são as cores das aldeias apelidadas de
brancas pelo discurso turístico oficial, a face visível do remoto e montanhoso
interior.
Alte, apresenta-se debruçada
sobre o vale plantado de verde e de árvores de fruta, no prolongamento fértil
do vale do Arade e, por estes lados, predomina o silêncio, a indiferença
perante os estranhos e os poucos turistas que por aqui se aventuram, com este
calor e neste fim de tarde de luzes fortes e sombras oblíquas
A deserta loja de artesanato, as
vozes de uma indiscutível serrania algarvia que discutem, como putos, à volta
de uma mesa de bilhar, o carrancudo empregado de bar, tasca, agente do euro milhões,
a idosa que olha de soslaio no largo da igreja para quem se atreve a circundar o
altar da matriz fechada, são evidências de que não há fiéis entre nós!
Na aldeia branca da serrania, há
habitantes de verdade que estacionam os seus automóveis nos becos sem espaço,
levam as crianças à piscina, nas traseiras da escola primária, transportam
camionetas de fruta pela estrada sinuosa e levam os velhotes pela mão até suas
casas, caiadas mas com cheiros e sabores de um quotidiano de aldeia rural.
Quando abandono a aldeia, sinto o
último olhar do vendedor de peixe que limpa a banca do mercado ao ar livre,
rápido e desinteressado, para quem aqui vem e nada deixa – talvez uma beata – e
rouba as imagens desta pacatez civilizada, que são as portas do algarve
serrano, fronteiriço e inacessível que começa ali, para lá das aldeias brancas.
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