Pesquisar neste blogue

Mostrar mensagens com a etiqueta Alma Ibérica. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Alma Ibérica. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Maria Luísa


Maria Luísa, o parque está silencioso porque é noite profunda, e a Maria Luísa, a égua que puxa a carroça não relincha, apenas obedece a trote às instruções do andaluz e desdentado comandante, que não troca os locais históricos e nos recorda que a égua nos agradeceria o nosso reconhecimento.
O som martelado dos cascos na pedra é fantasmagórico, e dá uma vida imaginária às sombras, ao recanto do romântico, ao do poeta, do soldado, tudo isto a Maria Luísa abarca.


E no território da Expo de 1929, há lembranças de Portugal, vestígios da epopeia ibérica, conquistas mais do que descobrimentos.
Em Sevilha à meia-noite, só mesmo a Praça de Espanha dorme!


sexta-feira, 31 de outubro de 2014

O descuido de Hércules






Reconheço o meu fetiche aberrante pelas fronteiras.
Posto de controlo de saída, posto de controlo de entrada, homenzinhos muito compenetrados do seu dever de guardiões de uma terra qualquer, uniformes diferentes, línguas que se misturam e, depois de tudo passado, ainda falta a alfândega, os controlos de segurança e, com um pouco de sorte, os cães que nos farejam os pés e uma revista corporal profunda.
Tudo isto, não porque mudamos de mundo geográfico, mas apenas porque os humanos se alimentam de posse, uma espécie de direitos de autor sob propriedade da natureza, da qual nos apropriamos recorrendo a uma bandeira, uma língua e um hino
Daí, homenzinhos compenetrados, portanto!
Portanto quando me aproximo de uma fronteira começo a sentir aquele bichinho que me corrói a espinha, a que muitas vezes chamamos de arrepio!
Descontrolado, uma adrenalina de montanha russa, nos segundos finais da subida que antecede a queda sobre o vazio.
E, muitas vezes, só há vazio depois da fronteira.
E quando aterro num local como Algeciras, a adrenalina passa a ser tão errática que nem me apercebo que há tipos que se atravessam nas estradas para me empurrarem para estacionamentos clandestinos, tão longe do barco, que só podia ser mentira.
Mas Algeciras é uma fronteira de trezentos e sessenta graus (bom, para ser preciso é só de cento e oitenta), com europeus a imporem um hino, uma bandeira e uma língua em África, com africanos a povoar o lado de cá das fronteiras da Europa, uns ilhéus – europeus é certo – a desfraldar uma bandeira, uma moeda, uma língua, um hino e, ainda mais, uma rainha, num rochedo de terra firme na outra ponta da europa, de onde era pressuposto viverem, uma fronteira a sul que é fronteira da natureza – ou de Hércules – porque separa mares e continentes, mas que afinal não é fronteira, apesar de parecer.
Tudo à distância de um só olhar, quer estejamos no pontão do porto de Algeciras, no barco para Ceuta, em cima do rochedo ou na marginal de Ceuta
Uma aberração diz J.
Uma fonte de inspiração, pensa N.
Ceuta é a fronteira africana – começaria por narrar a crónica de N.
O estreito revela a cor azul viva da sua superfície e no fundo do mar, que se comprime entre placas continentais, ficam as falhas tectónicas, provavelmente uma obra de Hércules, que ainda não adivinhava que, interferir com a natureza, teria repercussões geoestratégicas.



Tão inspirado me sentia com o azul do mar, o cinzento da neblina que pairava sobre as montanhas de África e o castanho do rochedo que quase não me apercebi que hoje, o deck superior do ferry para Ceuta ia cheio de polícias e marroquinos clandestinos algemados, prontos para serem recambiados para Sul.
E o marroquino rico, recém regressado de Portugal em férias – Vila Nova de Milfontes, imaginem – cantava as maravilhas de Portugal, paraíso tão diferente do agitado Marrocos onde um telemóvel à vista, significaria perigo de assalto.
- No teu país (fantástico país) não passa nada, é um paraíso – recostava-se a estibordo, olhava o mar, e chupava num cigarro bem enrolado em ervas exóticas.
E em Ceuta, também já houve tempos em que, nós, os portugueses fomos felizes.
Na geografia como na História, as fronteiras são mesmo efémeras!

domingo, 16 de junho de 2013

Chove na cidade festa



Chove na cidade anoitecida que arrefece a fúria espanhola, o burburinho da final da tarde de Sábado nas Portas do Sol, onde todos os madrilenos se pareciam conhecer nos pés do urso, um ponto de encontro natural das legiões de cidadãos que cerram fileiras e entopem os bares de tapas e cañas, entre as nove e meia e as dez da noite, que é o quilômetro zero das estradas de Espanha.
Pontualidade espanhola, um povo que se recusa a ficar em casa.
Mas a intempérie de temperatura calda (o verão asfixiante dos 37 graus, tem regresso prometido para a próxima semana) também parece acalmar a fúria dos homens estátua que povoam (como persistentes empecilhos de personalidade mutante) as praças da urbe turística, em busca de fama ou de uns euros que distraiam a crise e o desemprego.
Piratas e monstros, ícones do cinema e da animação americana numa dobragem sem legendas e em três dimensões.
Ou a fúria do homem sem braços que agita com a boca o balde das esmolas…
Ou o homem que grita na composição de metro o acidente da mulher grávida e assegura ameaçadoramente que não está a roubar ninguém mas que devem comprar uns lenços de papel por um euro, e os passageiros que baixam as cabeças e os olhos para não o ouvir, ou não acentuar a sua ira!
Ou a turma gótica que povoa o Templo Debod, de vista sobre a cidade e a casa de campo, com as luzes e as sombras que mancham o horizonte urbano em final de tarde
Piercings em cobertura de negro ao por do sol!
Apenas Cervantes e sus muchachos, Quixote e Pança, permanecem impávidos e serenos, no alto da sua estátua na tão nacionalista Praça de Espanha, ainda que na sombra da fachada imponente e cooperativa do maior arranha-céus da Europa após guerra.
E o Homem Árvore na Praça do Oriente.


Para eles, não há fúria nem chuva que os demova da sua missão que é a de abençoar todas as espécies que povoam os moinhos de La Mancha
Nem para a polícia sempre presente que lida, com distância e sem fervor, com o seu povo afirmativo e impaciente em relação aos tempos difíceis e à crescente multiculturalidade que os rodeia.
Tudo o que seja preciso para garantir que se mantém o excitante glamour da cidade fiesta.

sábado, 15 de junho de 2013

É dia de clássicos em Madrid



Madrid
Madrid Real
Real Madrid!
É um dia de clássicos na capital mais alta da Europa.
Na Real Rainha Sofia desfila, e até Agosto, a vida do grande e alucinado Dali em onze capítulos, em onze salas, desde a infância artística até às tentativas de projetar a arte em quatro dimensões, as reflexões do átomo e, em flashback, as aventuras cinematográficas e publicitárias da sua expedição americana, a premunição da guerra como um monstro que é o ser humano, que se estrangula numa imagem épica, a descoberta do surrealismo, “ o surrealismo sou eu”, e és mesmo porque olhamos para ti e para as tuas obras e entramos numa dimensão diferente, não é humana nem celestial, é uma espécie de estágio pós vida, imerso em paisagens profundas e tridimensionais de um mundo que só existe nos sonhos de inquietude e temor e nas imagens da infância, remetidas ao início de século!
É por isso um Universo Dali!
Tão magnífico que, depois do contacto com o universo do "surrealismo sou eu", a visão da cidade só podia ser diferente, alternativa e, em espaços, desconcertante.
Em Lavapiés, respiram- se as questões de uma cidade e de um país que vive nas extremidades da Europa remediada, mas também o regresso aos ambientes e à moda vintage, os cafés de pendor literário, a feira de desenho independente e design em La Boca de piercing nas extremidades das artistas alternativas e de uma indiscutível beleza latina, a caminho da Calle dos Embajadores, onde palcos improvisados promovem o entrosamento das civilizações em bailes de escola e a comunhão do flamenco e da dança do ventre, sem que se entenda se nasceu (ou não) uma nova raça indígena e mestiça.
Regressados ao tempo das fronteiras dos reinos católicos e sultanatos árabes na grande Península Ibérica.
A caminho do Rastro, o mercado de todas as pulgas, no bairro da Latina.
E ala Madrid porque é Domingo e mesmo fora de estação e degustando presunto ibérico com vista para o relvado do Barnabéu, a romaria de adeptos não cessa de rodear o estádio, è espera de mais um clássico de velhas glórias.
Não há tradição que resista a esta movida latina que deixa o bairro de Salamanca descansar no fim-de-semana, lojas de marca e de luxo inatingível sempre abertas em ruas desertas, mas entope os estradões do Retiro com uma inundação de barcos a remos, artistas de rua (parque) e versões latinas do rato Mickey que dão um colorido berrante e anglo-saxónico a esta parada de estrelas que são os madrilenos.
E enquanto as nuvens ameaçam novamente o passeio de barco da cidade inteira, a rapariga da máquina fotográfica, revela-nos um retrato clássico de Doisneau, não fosse ele francês e ela (presumivelmente) espanhola.
Este foi decididamente um dia de novos clássicos em Madrid!

quinta-feira, 13 de junho de 2013

A milha dourada



Gran Via é a nova milha dourada para os guias turísticos da capital do (antes) Império, mas é também o que resta da velha Espanha (dos seres) de fato escuro e bigode grisalho, dos engraxadores que acompanham o ondular da grande rua que sobe da praça de Espanha até ao Callao, plana nas alturas até a saída do metro, junto ao velhinho hotel que virou Trypp, na esquina da Calle de la Montera, para voltar a descer em graciosa curva pela direita fora, até desaguar no rio maior chamado Alcalá.
Apesar das novas montras de design e das aspirações pós modernas e da moda de apelo mediático que substituíram cafés e livrarias, das salas de espetáculo que paulatinamente convertem as sessões de cinema em musicais de reminiscências anglo saxónicas (O rei é Leão), as calçadas e as fachadas clássicas da grande rua ainda transpiram a Espanha dos Ducados e dos fatos cinzentos, dos sabores clandestinos de um refrigerante invulgar, uma espécie de primavera de Madrid na década de setenta do século passado, das touradas e do flamenco, das boinas bizarras da guardia civil, dos caramelos e dos boiões de perfume de litro, das roupas cinzentas e dos óculos de sol à Alain Delon e a grande sensação chamada de Tiburón, uma grande estreia de Spielberg em versão dobrada.
Não há nada de particularmente errado nesta visão da Espanha da segunda metade do século passado, convertida a si mesmo e ao grande espaço continental, como que a lamber as feridas de um início de século alucinante e fraturante.
Mesmo que as reminiscências deste lugar nesse tempo só sejam percetíveis para quem cá tenha estado!
A única nota aparentemente disfuncional nesta grandiosidade quase decadente são as prostitutas que parqueiam, à uma da tarde, na esquina da rua pedonal entre esplanadas e lojas de moda, vigiadas por velhos com penetrante olhar de chulo (os novos velhos de fato escuro e bigodes grisalhos) perante a indiferença geral e o despeito das próprias.
Eu quase que garantia que estas almas depenadas, que ficaram presas na escala do tempo, como fantasmas pululando entre os vivos, encurralados entre o passado e o futuro, são a única prova de que provavelmente a milha dourada já foi, em tempos idos, o coração (e todos os outros órgãos vitais) da grande Espanha nacionalista, uma monarquia de Rei exilado!
Obviamente apenas evidente para quem viu o Tiburón que se exprimia em castelhano!

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Puente Vizcaya – Engenhoso século XIX


Á entrada do fervilhante porto de Bilbao, nasceu uma obra magnífica do pragmatismo na era industrial: uma ponte que não é ponte mas funciona como tal sem estorvar o movimento de entrada e saída de navios de grande porte no porto de Bilbao.
1893, uma aliança fértil entre a arquitetura e a engenharia, o primeiro sinal de que Bilbao viria a ser, entre outras coisas, vanguardista.
Esta ponte não foi única, mas foi a única que se ousou reconstruir depois da destruição da guerra, com uma perseverança obviamente digna de um monumento, hoje orgulhosamente Património da UNESCO.
E os habitantes de Portugalete e Gexto continuam a usar o monumento como um objecto utilitário, que liga as margens em um minuto, trezentos e sessenta e cinco dias por ano.
Orgulhosamente anunciado.
“ Se funciona hoje? Claro, senão como poderia regressar a casa? " – o empregado do café de Gexto, um Portugalete absolutamente assumido, tirou todas as dúvidas de que a ponte afinal era ponte.



O ferry (Air?) suspenso ou basculante, atravessa com uma leveza de papagaio de papel, preso pelas costas como um acrobata previdente e todo o movimento pode certamente ser explicado pelos princípios da mecânica.
Nós, de certificado na mão, subimos aos cinquenta metros de uma vista deslumbrante e atravessámos por cima dos imaginários paquetes de luxo que já se sujeitaram à superioridade técnica da ponte, abanámos a nossa adrenalina, quando a roldana do pássaro fazia estremecer a passadeira e rendemo-nos ao vento norte que nos fustigava o rosto e o nosso equilíbrio, que sentíamos permanentemente ameaçado – obviamente apenas medo das alturas.
É uma sensação que supera definitivamente meia dúzia de pintxos (tapas) ao almoço, regadas de duas cañas.
Constam as crónicas que a (longínqua) família real deslumbrava-se como as crianças em voltas de carrossel de uma margem para a outra!
Tão surpreendente quanto a estrutura metálica – de um orgulho chamado ferro, a arte feita com os abundantes recursos da terra, certeza de que a arte é também um reflexo da indústria – são as margens, também elas com um atmosfera fim de século, que não pretendem disfarçar.
Constam as crónicas que emergiram como colónias balneares, e os espíritos dos elegantes veraneantes do século XIX, moldam as fachadas das moradias, do pequeno hotel ao lado da ponte, do varandim branco e dos candeeiros serenos plantados ao longo do passeio fluvial, rio quase mar.
Apesar dos miúdos de piercing no nariz que povoam este espaço, como seres completamente deslocados da atmosfera ainda persistente.
Transbordador, é como lhe chamam e, segundo Norman Foster, ilustre visitante, “é muito mais que as suas componentes funcionais e estéticas. Assim mesmo nos recorda com carinho toda a sociedade progressiva que suporta a cidade, determinada a criar, financiar e edificar uma estrutura tão memorável, para satisfazer as suas necessidades de transporte”.
Ele sabe, e nós acreditamos!



domingo, 1 de abril de 2012

A cidade Guggenheim




E subitamente, o reino do fantástico e do exuberante!
O Sol poente de fim de tarde provoca a incandescência na onda metálica, e a aranha abençoa a ilha imaginária, as esferas prateadas que se afundam nos lagos exteriores e a multidão que se fotografa em redor desta cidade de um modernismo tão soberbo quanto arrojado.
(Não necessariamente pela arte em si mas pelo símbolo que ela representa)
As placas de titânio são (serão?) as escamas de um peixe absolutamente estilizado, que irrompe de dentro do rio como uma baleia (sim, eu sei que não é um peixe!) e se eleva para além das pontes que unem as margens, mas têm uma personalidade de réptil (esguia e escorregadia, lânguida e perigosa), que rivaliza com o monstro metálico do Loch Ness.
E com o pôr-do-Sol, a cobertura do palácio da arte moderna apagou-se suavemente / a obra de arte da arquitetura contemporânea / a obra da arquitetura da arte contemporânea / não suporta luz artificial e indireta nas noites de luar em Bilbao.
Porque é desprestigiante e anula o encanto do despertar matinal /Sol Nascente, agora subitamente iluminado de tons prata chumbo!
Ou será porque na manhã primaveril, em hora de pequeno-almoço tardio, a vista quase aérea do terraço do vanguardista Domine debruça-se sobre o Guggenheim, tão próximo (debruçada que desfoca) dos telhados (o peixe não tem telhados mas sim escamas, talvez ondas) que a perspetiva da cor se dilui num cinzento envergonhado (o peixe quer mergulhar nas águas do rio, mas o vale é tão estreito que não permite que o rio engula esta obra de um outro mundo).
Para quem deambula pelos espaços abertos do interior desta catedral de modernidade, esta é uma estonteante alegoria aos sentidos, porque entramos noutra dimensão (os espaços abertos abrem-nos a mente para além do que julgamos possível) e chegamos, a espaços, a rever-nos com uma nitidez surpreendente na história contemporânea em peças que, noutro contexto, se tornariam opacas, inexpressivas e sem valor documental.
Independentemente da amplitude da nossa compreensão pelo abstrato, o museu é um desfile da história recente, primeiro espanhola e depois europeia, dispersa (sim, o termo é dispersa) pelos espaços gigantescos sobre o qual qualquer um vai pairar – goste-se, entenda-se, ou nem uma coisa nem outra!
A arte espanhola do século vinte é marcada pelo sofrimento e pelas almas rasgadas, feridas expostas em quadros que usam materiais pobres, industriais que se dilaceram, no sentido figurado e no sentido tão real, que juraria que a serapilheira tinha sangue.
São obras que choram as bizarrias egocêntricas da violenta e sangrenta política espanhola num país fechado e paternalista, um passado que começa a ser longínquo mas que permanece no referencial (vivo como se de um aviso se tratasse) consciência colectiva de um povo (ou de um conjunto de povos).
Sim, é possível sentir tudo isto num museu, talvez demasiado influenciado pela exposição de material fotográfico da guerra civil espanhola – a mala mexicana – tão detalhada, tão reportagem, tão Capa, exposta na véspera na única sala cheia de visitantes do museu de Belas Artes.
De espanhóis, daí a certeza de que existe uma consciência colectiva em estado latente, provavelmente sem feridas impossíveis de sarar.
Não, não vi carne viva, senti curiosidade e vontade de manter viva a recordação.
Definitivamente o século XX espanhol (ibérico) foi uma península periférica da (consciência da) Europa em construção
Qual jangada de pedra!
Enquanto isto, os autores europeus lançavam-se (embrenhavam-se) em universos experimentalistas absolutamente provocadores, procurando novas (cósmicas) fronteiras que escandalizariam as gerações contemporâneas e deixam-nos hoje, e ainda, perplexos!





Absolutamente fora de qualquer área de conforto, a cidade Guggenheim é definitivamente a desculpa ideal para visitar Bilbao!

quinta-feira, 29 de março de 2012

Euskadi essencial


É Sábado, e estão 26º na manhã do vale estreito e profundo, rodeado de montes verdes e uma ria que serpenteia para o mar, o feroz mar cantábrico, golfo da Biscaia que despeja tempestades entre dois raios de Sol ibérico, único máximo múltiplo comum de identidade assumida por este povo.
Mas Bilbao, escondida do mar e do ar por montes que a protegem de olhares demasiado superficiais é uma cidade de frases fáceis e de atmosfera quente.
À primeira vista, nada a parece diferenciar de uma qualquer outra cidade espanhola: uma população inteira que adora viver na rua, com toda a família, animais domésticos – perros de feitios diversos e tamanhos maioritariamente de bolso, velhotes que se aperaltam mesmo de cadeira de rodas, almoços e jantares em horas que não acabam, “Cenar? claro!”, uma gastronomia quase obscena de sabor e preço e um permanente ruído de fundo de um povo que nunca se cansa de (e tem sempre múltiplos motivos para) conversar.
Depois despertam as diferenças: levantamos os olhos da calle e a metros do vale, do centro, estão os campos verdes que ameaçam invadir a cidade, o vale e a ria – uma chapa da Suíça -; nos semáforos nenhum peão atravessa com sinal vermelho – disciplina e civilização que espantaria um nórdico mesclado – e a mobilidade das encostas é de uma tecnologia germânica – elevadores, escadas rolantes e funiculares que acompanham as ingremes calçadas ou os suaves declives da malha urbana que tece o vale.
A alma Euskadi funde-se entre estas duas dimensões: uma língua que é um código que se cultiva nas salas do museu das Belas Artes, uma professora que explica os quadros de pintura flamenga aos putos da escola, e as janelas pejadas de bandeiras Atlhetic – um clube só de bascos que é muito mais do que um clube –

Basco é o código!



A caminho do Casco Viejo das sete ruas, da Catedral e da Praça Nova, o moderníssimo mercado da ribeira confunde os sentidos, peixe fresco e escadas rolantes, mas não desencoraja a nossa descoberta da cidade antiga e viva, de tanto comércio e tapas e realça a complementaridade em que vivem as diversas urbes desta cidade.
A ponte de Calatrava, qual Puerto Madero, o metro de Gerry, e as torres de vidro que espelham a ponte na outra margem, desafiam o antigo sem o ofuscar, nesta quarta dimensão (humana) da cidade.
Em Bilbao vive-se uma permanente metamorfose urbana, da poluente e industrial revolução para o design inspirado na indústria – este jogo de palavras faz toda a diferença!

E Bilbao é mesmo uma cidade de frases fáceis.

O Atlhetic não ganhou este fim-de-semana e a cidade esmoreceu, mas não despiu as camisolas do clube, pela noite dentro!

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Barça, Gaudi e uma Nação (I)


É mais que um clube, é mais que um mero símbolo.
Barcelona reclama modernismo como uma bandeira, um desafio, mesmo um desaforo a favor da Catalunha, Estado Nação não fosse o Rei!
(E se o Rei fosse outro? Homem ou Estatuto?)
Gaudi, o vagabundo, mendigo do fim da vida, é o herói improvável, de refúgio para quem precisa de um símbolo, o símbolo da vanguarda!
Se o Rei foi/é/será consensual, com o desfecho fatal da guerra civil, a nação catalã foi suspensa!
(Um tutor que não dissolve a monarquia, mas que uniformiza um espaço geográfico – Nação? – sobre as cruzes da guerra dividida)
(União – Uniformização) um outro lado de uma moeda diferente!
Os grafittis recordam, que nem enterrado no museu da História, a Catalunha concede perdão.

~

Qual o efeito? Homem ou Estatuto?
Gaudi, o símbolo ressuscitado do modernismo catalão!



Como Picasso!
Como Dali!
Modernismo, Extravagância e ousadia.

A mesma guerra civil (ou teriam sido os anarquistas?) destruiu os planos de construção da Sagrada Família, e transformou-o (O) num mito e criou a discórdia eterna / o da interpretação hipotética do Mestre.
Estranha a contradição: podiam os anarquistas ser mais anarquistas que Gaudi?
Olé para a expressão “génios incompreendidos que só a morte redentora os liberta e os eterniza”
Desafio enorme à grande Nação (a espanhola?)!
Falta o Barça: Última irreverência de talentos, que se opõem ao interesse comum, que gere em função do padrão médio (vulgar?)
7 em 11 jogadores do campeão do mundo, representa o quê?
O Rei apressou-se a falar da União, espírito de sacrifício, um exemplo para a Nação…
Qual?
E se tivesse sido 11/11? A Nação teria sido outra?
Não foi afinal o resto do pé da ponta do corpo do apaixonado guardião do regime feito clube (também falamos do guarda redes) que salvou a Espanha do adversário?
Minuto (45;90)
Afinal não há proporções para uma vitória integral. Certo?
Algumas semanas depois, um milhão de catalães, nas ruas de Barcelona, contestou uma decisão do Tribunal, ofuscando-lhes a autonomia.
Afinal, proporção é proporção, e os catalães terão perguntado pelos avançados andaluzes!
Desafio, eficiência, ousadia, cores e bandeira: Camp Nou
Por vezes a mesma sobranceria dos vizinhos Castelhanos, cheio de amor-próprio e vaidade latente.
Já se sente!
É uma delirante cidade, onde se tropeça constantemente numa incontornável raiva criativa!


Avé!

sábado, 24 de julho de 2010

Menorca - a via alternativa



Menorca tem a dimensão apropriada para quem não tem uma ansiedade excessiva; gente que não transborda nunca para o nosso espaço vital, praias que fecham quando o parqueamento se esgota, cidades de dimensão e rosto com perfil humano, um campo que cheira a estrume, catorze mil quilómetros de muros de pedra, centenas de aldeias pré-históricas, uma civilização que vivia murada à beira-mar, nos montes quebra pernas e um mar de olhos verdes tão profundos que desassossega a alma de qualquer náufrago de terra firme!



Calas é um código de honra, com vontade própria e uns areais que nos destroem a iniciativa, aqui tão perto mas tão longe, que nos transtornam os sonhos de urbanos em baías de refúgio do Bom Selvagem, desnudadas de impressões digitais, impregnadas de paraíso, águas cálidas e pinheiros do Império Romano…quem disse que os romanos são loucos?



Calas é Menorca, razão que sobra para que acreditemos…grandes para quê?