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quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

A caminho do Aeroporto – Longe do cerne da questão






O Sul Soviético - Planeado por Estaline para ser o centro da grande Leninegrado
Estendida ao longo da Moskovsky ao longo de mais de cinco quilómetros
Quatro estações de metro
Desde o arco triunfo de celebração da vitória na guerra contra os turcos em 1828, desmantelado por Estaline para construir defesas antitanque
Atravessa o parque da vitória (Pobedy) WWII povoado por heróis soviéticos e Lenine interagindo com crianças
Contornada igreja gótica ordenada construir por Catarina, porque naquele local havia recebido as notícias da vitória sobre os turcos em 1770.
Passa diante da casa dos sovietes, saudado a partir do pedestal por Lenine, terminada após a guerra e depois da purga do arquiteto
No fim a rotunda do monumento dos defensores heróicos da resistência de Leninegrado ao cerco dos alemães,
Mas o taxista amigo do americano não me permitiu a melhor foto de Sul para norte toda a aguarela da história russa.
Eu tenho a certeza que foi de propósito pelo ar trocista com que recebeu os meus 200 rublos de gorjeta!
Como se ele estivesse perfeitamente consciente de que o Ocidente não é necessariamente o seu modelo e, apesar do seu passado americano, alimenta a crença de que existe uma via russa que não tem de ser obscura ou bolchevique.



Indiferente aos restos daquela geração que aguarda impacientemente o tempo de morrer
“Linha número 3. A carruagem não estava cheia e predominavam as mulheres de idade madura.
De semblante fechado, como se soubessem que a História já não lhes concede memória. Oito minutos demorou a carruagem a percorrer o escuro, entre Pobedy e Kievyskaia. E a mulher não deu pela nossa saída.”
“Nos museus nacionais, petrificados nas longas salas, de pintura russa do século dezoito, olham para o infinito, esperam que o tempo passe não entendem línguas estrangeiras nem os estrangeiros que chegam sozinhos aos museus e olham para eles desorientados porque não era pressuposto estarmos ali, nós que devíamos ter permanecido na outra Europa, naquela que já não há. Sim, na Rússia do século 21, há uma geração à espera de morrer. “
Integrados na paisagem do modernismo soviético, é impossível não reparar.
Absolutamente indiferente porque, afinal de contas, este já não é o cerne da questão.



terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Epílogo



Uma autocracia esclarecida que dedica, sem sufrágio, aos assuntos de ordem pública e segurança do estado e que se mantém distante do quotidiano dos cidadãos, na justa medida em que a inconsistência das massas ameace a implosão do estado, enquanto ente e culto de personalidade.
Sempre foi assim na longa e complexa história da Rússia, desde a criação da moscóvia até à revolução bolchevique.
Depois, a nova autocracia invadiu a individualidade e instituiu o construtivismo hiper-realista e desprovido da Igreja ortodoxa.
Setenta anos durou a utopia do proletariado num continente de camponeses
Hoje a vida quotidiana e artística reclama o individual, comete autocensura e parece desinteressar-se dos assuntos de Estado, para que a autocracia esclarecida garanta a ordem e a sobrevivência do estado e à ortodoxia religiosa a crença das massas.
Como um livro de História!
Mas obviamente não há garantias que a História se repita



segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

A última valsa

E ao sétimo dia, o vento enfrentou a chuva e coloriu os céus
E revelou estas vinte subtilezas do ser, um dia inteiro de imagens triunfais e redentoras.



























































domingo, 6 de janeiro de 2019

Envoltos em Utopias grandiosas





Em dia de tempestade nórdica, a capital czar revelou-se dentro de portas de forma absoluta, porque desconfio que não há subtilezas.
Os milhares de obras de arte das grandes escolas de pintura europeia, compradas (nem todas as potências europeias o conseguem garantir) pelo mundo inteiro refletem a necessidade de afirmação da Rússia como potência mundial.
Depois, certamente num plano secundário a admiração dos Romanov pelas pérolas da cultura europeia.
É no Hermitage que St. Petersburgo se pretende afirmar central e cosmopolita.
Mas em dia de tempestade nórdica, percorremos os rios que nascem da água do grande rio e afundamo-nos nos subúrbios sem tradição palaciana e imperial à procura da outra metade, onde renascem os templos da nova arte, antes que a chuva nos faça perder a consciência.
A aparente dificuldade de comunicação com os russos é provavelmente uma afirmação de diferença, de distanciamento em relação às origens da antiguidade clássica ocidental.
Ou não.
A espiritualidade desta nova arte, prolonga o fascínio pelas mitologias também elas helénicas, como no renascer da nação russa no século 17.
“Cristo e o deserto”
“Martinho e o pedinte”
“Druidas, jardins do amor”
“Adão e Eva, memórias da terra”
São os títulos dos quadros da primeira sala do quinto piso.


Mas também de revelações, que são surpreendentes, apenas para quem, como nós, desconhece a história deles.
“A consciência da inconsciência das multidões é a justificação para a existência de uma oligarquia de homens influentes que conduz as multidões nas questões de sobrevivência do estado”
Sempre foi assim desde o início da nação, enquanto império, ou com pretensões. Um estado autocrático que não se intromete na vida quotidiana
E no ERARTA a irreverência da arte contemporânea também se faz de mensagens que nos provocam arrepios de desconforto, a nós crentes da filosofia da antiguidade ocidental e que mesclam o construtivismo revolucionário do século 20 e as referências mitológicas para desconstruir as dicotomias clássicas da Crença e do Anticristo



Tal como a arte russa do século 19, as visões artísticas russas do século 21 são surpreendentes de modernidade e de entidade própria.
Quando aqui chegámos questionávamos como é possível conciliar a autocensura com a irreverência da arte de vanguarda. Afinal é!
Como também foi possível no reinado de Nicolau I, no século do iluminismo, das artes e da glasnost
Frequentemente, e com recurso a revelações tão inesperadas quanto familiares e de perceção óbvia, não fossem os russos um povo moldado pelo hiper-realismo.
E nós que adoramos perspetivas desconcertantes.
Como as de “Maria Madalena”, “Odisseia e as sirenes”, “Anjo no telescópio”, “Ivan, o terrível, a matar o seu filho” “O visitante Além-mar” ou “The appearance of god Veles in the forum of embryonic cosmos”, todas com uma ordem precisa e sem tradução.
Saímos do ERARTA às 10 da noite, cheios de visões misturadas de Ortodoxia religiosa e mitologias da antiguidade ocidental.
E de mais um jantar cosmopolita que parece não ter horas de fecho.
Cá fora, no subúrbio deserto, a chuva era apenas o reflexo das ruas nas luzes amarelas dos candeeiros públicos e um velho rondava a nossa espera e, entre o álcool e a falta de convicção, pedia dinheiro e evaporava-se nas nuvens que ainda persistiam no céu e na noite.

E, regressados às raízes do império, já longe das onze da noite, ninguém parecia interessado em voltar para casa.





Bansky to Russia



Adormecer em Moscovo e acordar em St. Petersburgo é uma mudança de perspetiva
A cidade está povoada de símbolos e estátuas do classicismo, do ocidente ambicionado, das artes e da cultura russa, da aristocracia czarina, longe da influência do povo e da Rússia profunda
Acordámos em St. Petersburgo e, no final do dia, é possível sentirmos a Rússia a se entranhar, especialmente para nós, que não nos conformamos com uma visão única e coerente da vida das pessoas.
Enquanto nos espraiávamos sem destino pelas margens de um rio que reclama os créditos de um mar e nos sentíamos incapazes de julgar o forte de Pedro pelo seu tamanho, passámos a acreditar que, para haver um todo é necessário cultivar, pelo menos, duas visões contraditórias da mesma realidade.
Como se fosse importante que Pedro tivesse criado uma pausa na História da Moscovia, da ortodoxia continental, como se procurasse mudar o paradigma de um país perseguido, do exterior e do interior transferindo-se a si e a ambição naval para junto do mar.
SP é isso mesmo, uma pausa na afirmação oriental da Rússia, ou a única forma de imposição ao ocidente de uma nova potência mundial e das fronteiras ocidentais diante dos polacos e, sobretudo, dos suecos.
Por isso aqui as margens nunca se tocam, as pontes reconstroem o sentido que cada uma das ilhas teve na construção dos diferentes períodos da história, um império que transfigurou o seu rosto num aventureiro e o seu espírito numa paixão pelo classicismo ocidental.
Nas cúpulas da Catedral do Sangue Derramado, nas ameias do forte de Pedro, no alto da estátua de Pushkin, nas entranhas de um armazém invadido pelas obras de Bansky ou à mesa de um aconchegado restaurante caucasiano.

Também eles a meio caminho entre Moscovo e Helsínquia, a imagem da última ceia da noite anterior.





quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Petrina, A Grande



Em S. Petersburgo sopra o vento do Báltico, que se infiltra nos canais ao sabor dos impulsos do inverno polar e das investidas da história, concebidas de memórias nórdicas e de fascínios ocidentais.

Em S. Petersburgo, a mãe Rússia manifesta-se com a timidez de quem sabe que não controla o destino dos filhos resgatados de forma tardia a uma outra genética
Quando nos confrontamos com a cidade que ainda esfrega os olhos de sono percebemos que, para lá das paredes austeras da gare central que ainda marca moscovo com bola vermelha no centro do mapa dos caminhos de ferro, existe uma nova alma cosmopolita que desafia, na geometria dos antigos traçados, as heranças do passado recente.
Pressente-se na ausência de pressão alta dos taxistas da estação, na arquitetura quente dos interiores forrados de madeiras, luzes indiretas, cestos de laranjas, vitrines redondas que envolvem os scones de sabores, uma ardósia que desenha em cirílico exemplar, as sugestões de pequenos almoço, mesas e bancos de madeira corridos, reminiscências estéticas do bom gosto e do minimalismo escandinavo.
E, no silêncio da internet sem fios, sobressai o direito à individualidade, os momentos de introspeção que se refletem nas vidraças do outro lado da rua, nos edifícios da universidade que jazem no tempo, submersos por árvores que estendem os ramos como raízes e atestam a permanência do saber.
E, sem surpresas, embalamos entre a visão da magia dos universos rurais de Kundera, e das novas dimensões tecnológicas do conhecimento, e nem nos apercebemos que esporadicamente os estudantes falavam uma linguagem local.
Os ventos do Báltico serpenteiam as avenidas e as ruas da Petrina, mas respiram-se as correntes de ar sem complexos de culpa, mostrando que é possível harmonizar a coexistência de ambientes e experiências, sem subtrair nenhum dos elementos essenciais da história.
É verdade que a primeira impressão é sempre efémera – e voltamos às referências de Kundera – mas SP revela, nesta manhã fria, mas cheia de sol, arrojo e mensagens subliminares, depois do dilúvio moscovita.
Começando pelo nome.



segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

A rapariga do bar



Infinito para além é o desenho que lhe rasga a pele por conta da aventura alemã, da amiga brasileira e do reencontro na primavera russa, por alturas do circo do futebol.
Nós éramos refugiados do diluvio moscovita que nos tinha empurrado para o lobby do hotel que vivia em círculo aberto com predominância das cores brancas e os formatos de uma nova geometria de espaços.
E ela era a rapariga do bar
Extrovertida, podia chamar-se Irina, mas o nome era o menos expressivo no olhar que saltava ao longo do balcão, que se escondia nas cornijas do bar ou nos levitava dos bancos altos quando falávamos entre nós o português de Portugal.
Mostrou-nos a tatuagem no braço, primeiro com orgulho, depois com uma inquietação que crescia na mesma medida em que os colegas homens começavam a rondar a nossa conversa, de um lado e do outro do balcão, em que as meninas da receção acenavam com as cabeças louras, lá longe, no espaço aberto, e interessava-se pela nossa opinião sobre a cerveja russa, jorrava uma curiosidade tão fluida como a espuma que saía dos barris, “gostam da cerveja russa?” e, perante o nosso acenar sincero, respondia que a amiga brasileira detestava a cerveja russa e que, durante as duas semanas do Mundial, beberam, comeram, divertiram-se e “whatever else” e nós não perguntámos mais nada, por pudor ou porque os outros continuavam a rondar o local, atestando cervejas imaginárias e pratos de salgados para clientes que não existiam no balcão.
E ela mostrava a mensagem cósmica, perguntava-nos se os portugueses entendiam os brasileiros e nós acenámos com a ingenuidade de um povo que fala a mesma língua, mas não partilha os mesmos significados e não alcança o misticismo mestiço dos irmãos além-mar.
Não temos tatuagens, insistíamos perante a incredulidade dela, não entendemos o significado subliminar de infinito para além, nem como mensagem de amor eterno, mas esforçávamo-nos por aceitar, afinal de contas “cada um faz o que está na sua consciência” enfatizava ela não deixando de olhar de soslaio porque os outros pareciam subitamente chamados à conversa quando ela afirmava que já tinha duas tatuagens na perna e nós, por pudor ou porque as sensibilidades russas não são o nosso forte, não perguntávamos mais nem pedimos para ver, apenas acenávamos obedientemente, “sim, claro, a nossa consciência é que conta” e ela perguntava se não bebíamos mais uma cerveja russa e nós, relutantes, dissemos que não.
Ela pareceu desapontada, porque não tínhamos tatuagens, porque concordávamos com tudo, porque não bebíamos mais cerveja porque, mesmo que eventualmente de forma vaga, a nossa presença e a nossa língua lhe lembrava a aventura alemã, e os momentos em que elas se sentiam capazes de transformar o mundo sem olhares reprovadores nem culpas inúteis, como eu a compreendia com, pelo menos, trinta anos de avanço, ou de atraso.
Enfiámo-nos nas profundezas do metropolitano de Moscovo e fomos apanhar o expresso da meia-noite.
Adormecemos sobre os carris que nos levavam para norte e sonhámos muito, com as tatuagens da rapariga do bar, a vontade de mudar o mundo, o dilúvio que caíra sobre Moscovo, as imagens dos veteranos que defenderam as cidades expostas à chuva dos jardins do anel da cidade, as sete irmãs de Stalin, a juventude bem vestida que apenas se queria proteger da chuva, navegar na net de linguagem universal e sons de Amy Winehouse e a chuva que nos tinha perfurado os ossos só porque não queríamos ir embora sem ver a Casa Branca, teimosia latina de não perder nenhuma referência histórica
E com a gigantesca praça komsomol'skaya onde Lenine ainda discursava às massas, eles são milhões e daqui partem comboios para Pequim, Vladivostok com travessia da Sibéria em sete dias e para onde o teu imaginário te levar.
E acordámos no Báltico do frio cortante e do céu azul.





terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Охотный Ряд - A curva à esquerda



Nos anos 30 do século 20 a arte encontrava-se ao serviço da nova revolução que se esforçava arduamente por afirmar Moscovo como o centro de um novo mundo, desenhado segundo os pincéis de uma boémia anarquista pré-guerra porque os padrinhos do construtivismo entendiam que a mensagem devia ajustar-se aos destinatários.
Apesar do curso da História e das correntes artísticas, há referências que o tempo não destrói, como a curva à esquerda na Охотный Ряд bem nas costas do pedestal de Karl Marx ou nos jardins do teatro Bolshoi. 
Em tons mais sóbrios e menos festivos, porque há uma nova geração de gente muito séria que habita nos contornos do anel dourado.
E o presente de Moscovo não tem a ambição de ser reconhecido como uma cidade em festa, prefere as referências discretas e austeras dos negócios e  do poder.
Mas a curva à esquerda sobreviveu à Guerra e à Paz.





terça-feira, 27 de novembro de 2018

Art Play





Os subúrbios de Moscovo estão para lá dos anéis dourados da cidade e, por aqui, não existem lobbies onde a corpulência da segurança é proporcional à opulência dos lugares
As avenidas permanecem largas, afinal são as mesmas, mas esta nova amplitude lamenta-se com a solidão dos passos apressados, dos pavimentos desleixados e dos prédios pouco cuidados que desfilam em mais de sessenta anos de construção em massa e de migrações inesperadas.
Alguns lançam-nos olhares desconfiados, mas poucos, a maior parte dos transeuntes apenas tratam da sua própria vida, há mais gente que circula de cabeça baixa e olhos pregados no chão.
Longe do anel dourado.
Como em todos os subúrbios, afinal de contas, em torno das nove estações de comboio da capital, todas elas com os nomes soviéticos dos seus principais destinos finais, muito tempo depois de terem derrubado estes símbolos da nomenclatura geográfica oficial.
Nos bairros para lá dos anéis há os procuram ascender na pirâmide da ambição e há os que se seguram à cidade e ao que resta das suas memórias.
São estes lugares que constituem o purgatório das cidades imensas.
Mas em Moscovo a proporção sofre de uma intensidade que é refém da história recente, em que a capital foi o refúgio menos do que provável de uma imensidão de povos, de deslocados de expatriados, antigos irmãos, depois inimigos.
Nos arrabaldes das linhas de comboio, alternam as visões entre a anarquia pós-império (sem que alguém tivesse distribuído previamente qualquer manual de instruções) e as reminiscências operárias de uma vaga de deslocados da ruralidade russa.


E, escondidos entre as traseiras de uma indústria extinta, nasce a Moscovo pós-industrial, em ilhas de um novo capitalismo exuberante e sem pudor, imersas nas carcaças velhas dos antigos armazéns revestidas de cores, cheiros e sons diferentes.
As antecâmaras dos túneis outrora sombrios, povoam-se de uma nova geração sem memória, que se move com a agilidade felina, roupas justas e de cores escuras onde a arte, a estética e o negócio, chegam de elétrico rápido e não trocam saudações com a vizinhança
O terceiro pilar da nova autocracia russa tem um novo olhar sedutor e uma convicção inabalável no destino.
A loura do Porsche Cayenne que sai velozmente do túnel obscurecido pela fuligem e pelo tempo é a prova de que restaram sobreviventes da lei seca e do processo de construção do capitalismo de fim de século.










domingo, 25 de novembro de 2018

Diálogos do século




A vida intelectual da Rússia de Nicolau I era condicionada na sua expressão pública por uma censura estatal dura, ainda que flexível.

Um conceito tão russo quão presente, reflexo das suas vocações orientalistas, uma forma estranha de lidar com a ambiguidade, pelo menos para os visitantes estrangeiros que descreviam a Rússia de Nicolau como um período noturno de repressão
Para a grande nação continental, esta foi uma época dourada nas letras russas em que a alta cultura russa se libertou da anterior imitação das artes ocidentais e produziram obras que alteraram os contornos da cultura mundial.
Nos romances e poemas de Puchkine apareceu o “homem supérfluo” o herói transformado em anti-herói, nas obras de Gogol ressaltaram as sátiras mordazes sobre as deficiências humanas do seu próprio tempo, personagens fantásticas e reviravoltas de enredos que anteciparam os escritos pós-modernos da nossa época, escritores que apresentaram, pela primeira vez, os servos enquanto personagens totalmente humanas.
E apesar das disputas entre os defensores do passado e do futuro, cujas únicos pontos comuns eram a oposição ao presente russo e o apoio à abolição da servidão, a maioria dos russos instruídos concordavam com a necessidade de censura e tinham orgulho em saber que a Rússia era a maior potência terrestre do mundo.
E, apesar de desconcertante aos olhos de um visitante ocidental, é fascinante ver a história pintada com os olhos da originalidade russa, aquela que se revelou na sua versão mais épica sempre que surgiu como reação a longos períodos de fascínio pelo esplendor ocidental.
Uma herança que povoou as memórias / tragédias do século vinte, uma sequência de pinceladas que confronta os exilados e as suas influências ocidentais temperadas pela nostalgia das estepes geladas e os que ficaram e conviveram com a história da maneira que quiserem ou puderam.
Visual, muito visual, como conhecer Lenine sem descontextualizar o conceito de guerra total, como reconstruir um regime através de símbolos, mas sobretudo retratos pungentes da vida quotidiana de um povo que insiste um sobreviver à imensidão do seu espaço exterior e, nas últimas salas, os retratos instrospetivos dos sentimentos de perda e desilusão e o desmoronamento da simbologia do século passado.
O novo Tretaykov revela-nos múltiplas visões da essência da história e de um povo, com tanta nitidez que custa a crer que, neste país, os instruídos professam, por defeito, o culto da censura.
Censura dura, mas flexível
Só os russos entendem, mas o resultado é épico, estes diálogos do século podem ser mesmo empolgantes