Ele olhou para o desenho e teve
vontade de chorar. Era pavorosa a composição de cores berrantes que mal
preenchia aquela folha de linhas com uma dobra à direita, que o separava a
punitiva prisão que se chamava primária da primavera libertadora que adivinhava
no ciclo preparatório.
Mas uma lágrima fortuita foi o
suficiente para dar vida àquele borrão de cor a que o solene e assustador júri
chamava de prova de desenho. E logo a folha de papel ganhou relevo e, entre
montes, arvores e aquela casinha tão primitiva quanto tortuosa (até a chaminé
fumegava direita ao Sol) a poça transformou-se em lago e emergiu a cova dos
sapos, tão reais eram os sons dos sapos aos saltos que ele se assustou, naquela
carteira de sala de aula, uma combinação de cadeira e mesa castanhas, de
inclinação vertiginosa para as inseguranças dele e para os lápis que não cabiam
na ranhura a eles dedicada
E um sapo saltou da poça, da
folha de papel, do desenho inacabado e infeliz, salpicando as lunetas
arquejantes e bem construídas do menino Einstein.
Saltou da poça, a única
superfície molhada da cova dos sapos, um acidente físico de origem
desconhecida, repleto de dunas arenosas e um patético charco, que evoluía entre
uma sombra de lodo e uma piscina infantil, natural é certa, mas suficiente para
manter ativos os seis sapos que, por ali, tinham decidido permanecer, bem para
além dos Invernos rigorosos de outrora
Mas havia lei e ordem no charco:
havia um rei, o rei sapo, e a miudagem que preparava romarias ao longo da poeirenta
estrada real, logo o tinham identificado no alto do seu grande papo, papo de
sapo bem entendido, papo de rei repetiam os putos, habituais salteadores destas
remotas paragens.
Bem, remotas para quem tem nove
anos e umas bicicletas tão remendadas quanto os seus joelhos, que os calções
não escondem e os travões não travam!
Do cimo dos montes Golan – um dos
putos tinha vocação geopolítica, e esta linguagem militar pretendia
identificar, sem equívocos, o ponto mais alto do mundo dos sapos - avistava-se,
se bem que remotamente, os últimos prédios da vila, o parque municipal…
…E o Tribunal – sentenciava o
outro puto, o juiz imperfeito
Esta comunidade de anfíbios vivia
a sua perene vida entre os montes e seus arredores e durante o dia evitava
afastar-se do charco – ou lago conforme a chuva e a altura do ano – porque
aqueles putos não eram de confiança.
Com o rei sapo viviam os seus
súbditos: A princesa batráquia, o sapo gramofone, o anfíbio maratona,
E neste dia tão decisivo para o
jovem Einstein, foi o sapo gramofone que decidiu dar vida à prova de desenho do
pretendente a cientista sem vocação para a arte de desenho e invadiu a sala de
aula aos saltos, de secretária em secretária, júris incrédulos e outros
assistentes eufóricos por esta demonstração de natureza viva no salão de
mestres de escola, velhos descendentes dos dinossauros…
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