Shut up ýou jerk - Manuel Alves (Fundação Serralves - O olhar dos artistas)
Não quero dormir, vou abrir muito
os olhos, não me vou deixar entorpecer pelas vozes que crescem no eco dos
corredores, apertados mas frios, vozes profissionais mas também vozes
sonâmbulas de quem acorda de uma anestesia agitada, de quem se agita por um
diagnóstico reservado das entranhas, vozes que se diluem por detrás de cortinas
que não nos protege das nossas vulnerabilidades e claro, vou pensar muito alto
nas realidades terrenas
E se não adormecer, como irei
acordar? – E foi o último pensamento terreno que conseguiu agarrar, deitado
numa maca gasta de tanta logística e de alvura própria de locais de uma
medicina preparada para as boas notícias, preso por fios, ligado a ecrãs que
debitavam números.
Rastreio – classificam eles
Silêncio, como se tivesse medo
dos sonhos e a última imagem que reteve antes da escuridão em que mergulhou,
foi a do professor Hélio, o neurocientista que inventou a máquina de fotografar
os sonhos, bebendo chá em casa da Moira, sob a copa florida de uma enorme
laranjeira afirmando, entusiástico da sua descoberta, que sonhar é ensaiar a
realidade no conforto da nossa cama (in A
Sociedade dos sonhadores involuntários – José Eduardo Agualusa)
Ele procurou seguir o conselho do
professor, “…devolver ao sonho a sua vocação prática”, mas apagou-se, sem
sentir o esboroar das batas brancas ou a frase seguinte do homem do sono, agora
vai dormir.
E o ecrã dos dois números mágicos
apagou-se de imediato sem que se tivessem manifestado falhas de energia
invocáveis ao sono profundo do paciente de rastreio.
E voltou a acender-se, cheio de imagens
que a classe médica parecia incapaz de explicar, tão nítidas que se
assemelhavam a uma revolta das entranhas.
Dias de escuro e de luz - Julião Sarmento (Fundação Serralves - O olhar dos artistas)
Shoreline - Bruno Pacheco ( Fundação Serralves - O olhar dos artistas)
Sem Titulo - Helena Almeida (Fundação Serralves - O olhar dos artistas)
O que eles lêem - Carla Filipe ( Fundação Serralves - O olhar do artista)
Aprender a viver com o inimigo - Pedro Neves Marques (Museu Berardo)
Museu Berardo ( A única imagem que ela recordaria mais tarde mas que, ainda hoje, se questiona se foi sonho ou se será realidade)
E o homem (ou seria uma mulher)
que não queria dormir acordou das trevas num lapso de vazio (porque ele não
queria dormir, não existe tempo de acordar) e, hoje, apenas se recorda de uma
enfermaria a preto e branco, cercada de seres de bata branca – pareceu-lhe
reconhecer o professor Hélio, mas já não tem a certeza – que se dividiam entre
olhares curiosos e alguma inquietação nos sinais do ecrã mágico que insistiam
em debitar dois números mágicos, 66 e 98, números brancos contra um fundo preto.
E em vez das cortinas brancas de
uma realidade asséptica ela viu-se rodeada de uma tela quase transparente que lhe
anunciava ter regressado ao mundo dos seres acordados.
Ser e Estar - Museu Berardo
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