Meio-dia e meia hora e o restaurante
começa a encher-se de professores e alunos da escola vizinha, vendedores e
empregados de escritório, e todos parecem conhecer-se, entre a sopa de grão com
massa e o arroz de peixe que, por aqui, se serve ao prato “ porque me custa ver
o desperdício” de quatro euros e meio.
Afinal de contas esta vila do
Oeste profundo – sim, também há profundidade no litoral às portas de Lisboa – vive
numa paz rural e poupada, entre a autoestrada e o mar, num descuidado visual,
próprio de quem não tem tempo para os assuntos urbanos, nem património
monumental para atrair multidões.
A Lourinhã é uma não zona,
encravada entre os mosteiros e os castelos do norte e a grandeza absorvente da
capital do império, onde mesmo as praias de areia branca e reputação
aristocrática sofrem de uma súbita interrupção no mar encapelado mas feio e
feroz do Porto da Barcas, local esburacado e entrincheirado pelo mar e pelo
casario desordenado e nada reluzente.
O oeste
por onde todos passam, sem parar.
Vimeiro a
Sul, Praia da Areia Branca a Norte, mas não ali.
Excepto os
dinossauros, milhões de anos atrás, segundo consta por vontade própria e os
franceses napoleónicos que se terão enredado nas tortuosas geografias destes
locais, esses por vontade dos ingleses (bom, e de alguns de nós também), também
eles entrincheirados entre as Linhas de Torres e o regresso não desejado às
origens.
(Aqui há
alguma liberdade literária, porque não há referências aos franceses por aqui, e
era no Sobral e em Torres – um pouco mais abaixo desta não zona – que se
desencadearam as maiores e mais decisivas batalhas)
Consta
contudo no assobio do vento que vem do mar em sopros largos e curvilíneos
torneando os montes e penetrando no vale, que ainda deambulam almas penadas de
uniforme napoleónico, nas perigosas e instáveis arribas da Lourinhã.
Pronto, e
sem entender muito de escavações e bichos pré-históricos vejo-me na contingência
de por aqui rondar sem destino nem companhia (não há gente na vila à hora do
almoço, versão sesta ocidental e marítima, ou apenas a malta vai almoçar a
casa?), esperando pacientemente (eu e os velhos do largo da igreja que me olham
desconfiados, mas nada curiosos) a abertura do museu, que fechou para almoço
das quatro entusiasmadas e orgulhosas colaboradoras e só abre as velhas portas
depois das duas e meia.
Orgulhosas
e de um brio profissional de quem sabe que nunca mais este local foi tão
profícuo e famoso quanto há 100 milhões de anos!
E têm
razão. Apesar de só e pouco impressionado com o espólio etnológico e com a sala
das profissões, de dinossauros percebem eles.
E, apesar
de só no pavilhão da paleontologia, rodeado de bichos enormes (e, ainda por
cima carnívoros), não senti muito medo, porque de facto só restavam ossos e
todos os placards me garantiam que já tinham morrido há uns largos milhões de
anos.
E estes não são tão espectaculares quanto as réplicas de materiais sintéticos doutros lugares, mas são genuínos,
ossos, ovos e a reconstrução do grande carnívoro que atravessa a sala e cujo
nome se me eclipsou!
E as descobertas de ossos
continuam!
Museu da Lourinhã descobre novo fóssil de dinossauro
carnívoro e termina Agosto com uma mão cheia de novos achados de dinossauros.
Terminou na semana passada mais uma campanha de
verão do GEAL – Grupo de Etnologia e Arqueologia da Lourinhã – que
tradicionalmente concentra as suas escavações nesta altura do ano, nos
afloramentos do Jurássico Superior da Lourinhã, com cerca de 150 milhões de
anos.
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Este ano, os resultados incluíram pegadas e ossos,
com destaque para um dinossauro carnívoro de pequeno porte, com menos de dois
metros de comprimento. Este esqueleto de dinossauro não está completo, mas
está muito bem conservado e articulado (com os ossos na posição anatómica,
tal como em vida), o que é muito raro. A análise preliminar indica que poderá
tratar-se de um representante de um grupo de dinossauros carnívoros raros em
Portugal, os celurossauros.
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