Bab Doukkala
Hakim abriu muito os olhos para, logo depois, abanar
a cabeça com uma expressão de desaprovação contida, como se Bab Doukkala fosse
um sinónimo de um bairro de reputação duvidosa
“Rien à voir”, foi tudo a que conseguimos saber sobre
Bab Doukkala.
De Hakim, o gerente do Riad.
Do empresário de sucesso, dono de um restaurante que
servia álcool, proprietário de um riad, que falava cinco línguas, também norueguês,
balanceava os sapatos de vela, sentado no banco alto do balcão do bar
“ Acho que nunca por lá passei “ – alvitrava,
sorridente e sem vergonha, enquanto bebia mais um gole de um líquido cor de
rosé, que alimentava a ambiguidade da sua natureza perante o irredutível livro
sagrado.
De todos os outros, até do Ahmed, o motorista que
conhecia a história e tinha opinião sobre o presente que abanou a cabeça em
sinal de assentimento baseado numa não assumida ignorância deste tema tão
antigo.
“Aqueles unidos na casa de Deus” fundaram Marraquexe
em 1070 a partir de tendas berberes, mas destes momentos épicos da civilização berbere,
a partir dos quais o Islão se iria assumir como um farol de modernidade de
civilização do mundo ocidental, quase nada sobreviveu.
Especialmente as memórias.
Ibn Yasin era um homem alto, curioso, corajoso e de
forte personalidade, garantia o historiador, um homem que olhava o deserto, o
conquistador, o guerreiro.
E um estudioso do Islão
E o líder da tribo do deserto que criou o primeiro
reino berbere de Marrocos, unificado a partir do Sul.
Os Almorávidas construíram, em vinte e seis anos, um império
que se estendeu para leste muito para além do Atlas e para Norte até à
Península Ibérica.
Um exército, um líder espiritual e o domínio das técnicas de utilização
da água foram a base da primeira Jihad da História.
Começaram por dominar as rotas comerciais do Sul e o ouro permitiu-lhes
aventurar-se para o desconhecido, as terras férteis e povoadas do Norte da
cordilheira do Atlas.
Segurança, impostos e expansão dos territórios, foi a fórmula da expansão
Beleza, harmonia e simplicidade, foi a fórmula da
construção da sua capital, Marraquexe, destino do herdeiro do guerreiro do
deserto, Tashfin, o organizador e homem que, sem renunciar às raízes do
deserto, unificou sob a lei e a fé de um único território, as fronteiras do
império, o reinventado Al- Andaluz.
E Bab Doukkala é a porta da simplicidade Almorávida.
A única lembrança que a cidade preserva dos seus
fundadores, e do início do período mais promissor do Islão.
Hakim não deixou de nos referir, com alguma veemência
mesmo, que a família dele é berbere.
Sem que eu tenha entendido qual o verdadeiro
significado desta ascendência, num reino em que não existem minorias étnicas,
mas o Rei pertence a uma dinastia árabe, que reclama ser descendente do Profeta.
Mas não sabia que a porta de Doukkala é a ligação da
cidade ao deserto e às suas raízes.
Apesar de não ser garantido que as nossas hipotéticas
raízes árabes provenham dos berberes, não resisti ao chamamento e mudei as
agendas para a atravessar.
Reconheço que havia pouco que ver.
Exceto o imenso significado deste símbolo de uma
tribo com visão geoestratégica.
Koubba Bayoudin
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