Ainda não é meio-dia e o calor já nos assa as entranhas
Nas redondezas da Hauptbanhof não vislumbramos coerência de
transeuntes
Procurava um contraponto para o orgulho da finança alemã e encontrei
logo nas bermas e nas fachadas dos restaurantes de nacionalidade indefinida, os
primeiros desoladores seres sem naturalidade precisa, arrastados para o torpor
pelas sopas de cavalo cansado
(a globalização tem destas coisas, embrulha o prato de
salsichas em celofane de origem chinesa)
Outros assavam pedaços de carne na pedra, libertando uns
fumos de cheiro a churrasco, em cima das mesas, ao longo da rua que nos
aproximava do centro da cidade.
E àquela hora, que ainda nem meio-dia era, o torpor era de
miragem, tal era a lentidão de todos os nós que nos arrastávamos pela praça
Willy Brandt, reflectidos nas fachadas de vidro do Banco Central Europeu, em
dia de descanso, não havia fatos elegantes a atravessar as ruas.
O orgulho de Frankfurt estava neutralizado pelo Sábado, pelo
Verão e pelo calor.
Tudo sem adjectivos, porque até os meus pés pareciam
miragem, tudo em câmara lenta.
Até que o centro da cidade nos submergiu com uma LGBT Pride
Parade
Primeiro tudo muito sério, harmonia entre público e
manifestantes…e beijos lançados dos carros alegóricos, trânsito cortado,
patrocinadores respeitáveis, cordão policial e carros de limpeza a terminar a
festa, exactamente no momento em que ela acabou
O público, ou partilhava convicções – eram de fato muitos –
ou comia salsichas nas esplanadas da cidade, absoluta tolerância que não
difere aliás muito da indiferença
Tudo parecia correr bem, de acordo com os sinais do tempo
quando o folclore se instalou na praça e um monte de rainhas dragão confundiram
as mensagens de direito ao amor polivalente com um balde entornado de mau gosto e animais histéricos em esotérica compulsiva.
Para além de um mini coelho morto que para as manter
intactas lançou o pânico nas hostes, abandonado num beco sem que o culpado
fosse julgado
As minhas memórias de F. são fortes e, por isso mesmo,
basta-me uma imagem da estação ferroviária para as preservar!
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