Atravessar o Sado num dia de Sol,
numa manhã de semana sem pressas e de multidões ausentes é uma experiência
azul, salpicada de rostos que se destacam da paisagem.
Este encadeamento de azul é um
prelúdio das terras do Sul, uma luz que apenas o Sul tem!
E os tempos, os muitos anos não
mudaram este lugar, esta mesma sensação dominante. Os barcos mudaram, a
paisagem urbana das duas margens mudou e evoluiu (ou se construiu, equívoco
após equívoco), mas o essencial permanece intacto desde que me lembro, com um
bando de colegiais a estrear a época balnear no último dia de aulas, quando miúdos
olhávamos o barco pneumático, símbolo da modernidade, que voava alucinante por
cima das águas do Sado, e nós nos verdes jardins da margem, abençoados pela
Santa que nos observava na redoma de vidro, par a par com a simplória arquitetura
do Estado Novo.
Família, Pátria e Autoridade
A absolutamente idêntica
sensação, décadas de criança, adolescente e adulto.
Na adolescência experimental de
campismo quase selvagem, devorados por nuvens de mosquitos que enevoavam o azul
em fins de tarde épicos e sem surpresas nas dunas que eram a fronteira das
fronteiras, um pasto de esfomeados e microscópicos animais, hoje ilha entre condomínios
privados.
Como adulto nostálgico,
refugiava-me sempre que podia, mesmo de fato e gravata, pelos caminhos de
Santiago do Cacém, mais próximo mas mais longo, numa pressa profissional que se
desvanecia nas lombas da estrada, nas raízes dos pinheiros que se infiltravam
no alcatrão da estrada
A serenidade peninsular – a verdadeira
razão da mesma sensação, década após década – aumenta o brilho das cores, e
assopra suavemente a neblina ondulante da manhã tardia.
E sempre que olho para a
fronteira do mar, lembro-me…e a sensação sempre igual.
Vertigem azul!
Skipper, o meu golfinho
imaginário do rio Sado que tantas vezes se riu para mim, sem me gozar, apesar
de eu não saber saltar como ele, eu debruçado sobre a amurada do ferry, ele
perto e longe, sempre mais rápido que o meu olhar, sim o Skipper hoje não
apareceu.
Também o Skipper não se deixa
domesticar, tal como a península sem pontes para o continente!
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