O mundo é dual e a cor é um instrumento de intromissão do Homem no Meio.
E por isso nos pareceu tão natural que as paisagens geladas
do Sul fossem cinzentas, porque as baleias, os pinguins, os albatrozes dispensam
as cores tom de pele.
E a cor ostensiva dos repórteres da loucura humana feriu-nos
a vista, e não era só o vermelho sangue, mas também o verde trópico doença, o
castanho desolação e pobreza, terra ferida de poluição, violência e morte, o
azul gélido cor de norte em fúria.
Por isso a paisagem de múltiplos tons de cinzento colocou-nos
no devido lugar, como seres transitórios que povoam uma terra intemporal, que
existe muito antes de nós e, quem sabe, depois.
Visitantes, foi como nos sentimos no universo de Salgado, e
ninguém se lembrou de pedir cor, porque ela era óbvia nos contornos de cada
imagem.
Confundidos, horrorizados, incrédulos, desapontados mas
também presos ao presente, a tempo que tem princípio e fim, foi como nos
sentimos diante das imagens dos repórteres do híper realismo.
Na Ucrânia, take 1 as manifestações sangrentas dos
habitantes do país ocidental, take 2 a guerra civil dos habitantes do país
oriental, take 3 bagagens abandonadas na estepe do avião que se despenhou entre
duas fações, passageiros mortos presos nos assentos ou caídos nos telhados das
casas de quem já não distingue acidente de guerra.
Cor, muita cor...
Na Mongólia em decomposição desordenada, ou em
desenvolvimento descontrolado em que, no mesmo país, há povos que se tornam
indecifráveis entre si.
Na China, sempre na China, a vertigem do grande, impessoal e
incontrolável.
Em África, o verde e o castanho dos trópicos, saturado de
doença
No Médio Oriente, o mesmo choque de sempre entre povos que
têm o mesmo Deus, mas ainda não o perceberam.
Os drones mortais, os raptos ignóbeis, as execuções públicas…
Por isso regresso sempre ao universo da monumental terra
mãe.
Cinzento redentor, este, o do mundo a preto e branco de Salgado
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